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Mauro Cezar Pereira

Abel Braga: “Flamengo é muita posse de bola, estou tentando tirar isso"

Mauro Cezar Pereira

05/03/2019 04h00

Dois dias antes de embarcar para a Bolívia, onde nesta terça-feira o Flamengo estreia na Copa Libertadores diante do San José, na altitude de Oruro (3.735 metros acima do nível do mar), o blog conversou com o técnico do Flamengo. Nos 47 minutos ao telefone, Abel Braga explicou sua estratégia no Fla-Flu, quando foi eliminado da Taça Guanabara, justificou a preferência por Willian Arão entre os titulares e analisou sua defesa, vazada em sete de oito partidas. O treinador, que voltou ao clube quase 15 anos depois, admitiu que está, sim, mudando a forma de jogar dos rubro-negros.

Abel Braga em treino do Flamengo: opção por Willian Arão entre os titulares porque "recompõe melhor"

Por que você não abre mão de dois volantes?
Eu já tenho cinco jogadores com menos de 1,75 metro de altura. Pedi dois jogadores, o primeiro que pedi foi Dedé e o outro Bruno Henrique. Bons no jogo aéreo. Para a posição tenho no meio-campo jogadores como Arão, Cuellar, Ronaldo, mas aí têm a mesma característica. Mas Arão é bom pelo alto…

Mas ele sai mais…
Meu time joga em triangulação pelos lados, o centroavante tem liberdade. Era assim com Fernandão (no Internacional), Fred, Dourado (ambos no Fluminense) e agora Gabigol. Arão também tem liberdade para sair. Os laterais jogam alto (avançados), preciso recompor. O time está com boa verticalidade, não roda e roda sem definir.

Sim, times que treinou antes tinham essa característica, Aranguíz no Internacional, por exemplo.
Antes eu jogava com Edinho e o segundo era o Tinga, que só não tinha a bola aérea, mas chegava na área. Se você puder atacar com um número igual ao adversário se defendendo, ótimo, mas mesmo sem a bola, tenho que procurar ter superioridade (numérica).

Arão não está mais para meia do que volante?
Sim, não tenha dúvida de que ele sai, mas tem recomposição melhor. Se eu tentar Diego, Arrascaeta ou Éverton Ribeiro na função, vão atuar mais perto dos atacantes. Esse é o problema, se eu tiver que fazer isso não posso ter os dois laterais altos ao mesmo tempo. Minha intenção é alargar ao máximo o time adversário e trabalhar triangulações por dentro e na saída de bola. Meus times são trabalham mais pelos lados do que por dentro.

Mas jogar com um volante não faz com que seja time de índio, faz?
Não é impossível jogar com um volante, mas eu ainda não tenho um time com grau de confiança para fazer o Diego atuar ali. Ele já confessou para mim que jogou na Alemanha de segundo volante. Ou o Éverton Ribeiro saindo do lado direito, como fazia no Cruzeiro, e virava segundo volante em algum momento. Eu prefiro que meu jogador tenha uma confiança adequada e recomponha mais, tenho que sentir que terei recomposição.

Como analisa a falha de Arrascaeta no gol da Portuguesa?
Nós temos saída boa, com Léo (Duarte) por exemplo, por dentro, Rodrigo Caio e Cuellar, ali problema zero. A bola estava no pé direito do Renê, se ele (Arrascaeta) não vai ali, mandava uma bola longa, não teria problema nenhum.

Isso não mostra que o time, sob pressão, ainda não está pronto para fazer uma boa e segura saída de bola?
Meu time não consegue sair com a bola de trás como faz o Fluminense, mas aquele é o estilo do (Fernando) Diniz. Legal pra cacete, mas o time deles quer espaçar, é diferente…

Isso não significa necessidade de melhorar a saída de bola sob pressão?
Estamos trabalhando isso. Trabalho minha defesa nos treinos contra seis, sete jogadores, para obrigar a sair, mas contra Portuguesa e Fluminense foi em domínio de bola que perdemos.

A defesa te preocupa? Americano finalizou 10 vezes e o time sofreu gol em quase todos os jogos, menos da Cabofriense…
Caímos naquele papo do cara que recompõe melhor. Contra Portuguesa e Fluminense nós tínhamos a bola dominada e perdemos. Contra o Bangu eles bateram lateral e fizeram gol de cabeça. Não é uma coisa extremamente preocupante, estamos tomando mais gol por perda de bola do que com o adversário chegando, tocando.

Jogando contra o Fluminense, que os derrotou, mudaria a estratégia hoje?
Faria diferente no tiro de meta, deixei eles saírem, não deixaria mais. O primeiro chute do Fluminense foi aos quatro do segundo tempo (na verdade foram 10 finalizações tricolores, seis no primeiro tempo, a primeira no alvo com 10 minutos de partida). Tivemos chances claras desde o primeiro tempo e uma antes do gol deles com quatro jogadores contra dois.

No Fla-Flu você adotou a estratégia de deixar a bola para roubar e acelerar…
Exatamente, o Fluminense joga com três atacantes, Luciano, Everaldo e Yony, e são todos rápidos. Se você for mal na saída de bola deles vai se complicar. A estratégia pode não ter sido a melhor, mas eu tive as melhores chances. E tomamos um gol aos 89 minutos.

Você está transformando o Flamengo num time mais reativo, certo?
Não vou impedir o jogador de tocar a bola, como será agora, na Bolívia, a 3,7 mil metros. Tem que tocar a bola. Mas minha maior preocupação foi tirar um pouco desse toque de bola muito lateralizado, tenho que tentar fazer isso. Mas nesse jogo de terça-feira eu tenho que ter cuidados, não podemos ser verticais, a bola corre a toda hora.

Mas o Flamengo, contigo, está deixando de ser um time de toque de bola…
O Bruno Henrique tem um jogo aéreo absurdo, com Gabigol perco um pouco no jogo aéreo e ganho na antecipação e em outras qualidades. Berrío e outros estão dando assistências e fazendo gols. Gosto de um negócio mais rápido, é o que eu gosto mesmo. E isso fica claro nos times que trabalhei. Gosto de atacar com jogadores pelo lado do campo.

Falado em lado do campo, e o lateral batido da área, você inseriu isso…
Essa bola de lateral para você defender é muito mais complicada do que o escanteio.

Mas Abel, estatisticamente está claro que em mais de 99% das vezes essa jogada não dá em nada…
Realmente, não saiu gol assim, só um na Flórida Cup. Mas quando o adversário corta de cabeça e ela cai, ganho com três jogadores no rebote. Se eu devolver para quem bateu não vou fazer nada.

Não acha uma jogada pobre? Você tem a posse da bola e abre mão para jogar aleatoriamente na área, para tentar pegar a sobra, a segunda bola. Grandes times do futebol internacional não fazem isso.
Eu tento posicionar para ganhar esse rebote. Moisés, Reinaldo, Marcos Rocha usam bem essa jogada. Vou me sentir mais cômodo se eu ganhar esse rebote. Me sinto mais seguro do que jogar apertado. É a minha forma de pensar.

Flamengo pode jogar em algum momento sem os dois velocistas?
Terei pelo menos um deles, sempre. A posição que Arrascaeta rende melhor é na esquerda, Vitinho e Bruno Henrique também. No jogo contra o Americano ele (Arrascaeta) começou pela direita e depois foi para esquerda, trocou com Vitinho, saiu gol, funcionou. Já Berrío é sempre do lado direito. Meus times não têm esse meia ofensivo pelo lado do campo.

Então você pensa em aproveitar o Éverton Ribeiro em outro papel, que não o do meia que atua aberto pela ponta?
Ele e Arrascaeta podem jogar ali, mas para fazer as jogadas por dentro, tanto que Arrascaeta já jogou e treinou várias vezes pelo meio. Contra a Portuguesa, quando tirei o Diego coloquei ele por dentro, mas o uruguaio é diferenciado, principalmente se tiver dois caras rápidos no time.

Você tem vários…
Com Gabriel podem ser três. Tenho que fazer esses caras correrem, trazer a defesa do adversário e entrar nas costas deles.

Éverton Ribeiro, Arrascaeta e Diego disputam uma posição ou duas?
Duas posições hoje. Com exceção do Diego, posso ter um deles por dentro ou pelo lado.

De qual sistema você gosta mais?
Com os dois rápidos pelos lados. Normalmente foi como eu sempre joguei. Mas, como eu disse, o Flamengo é muita posse de bola e estou tentando tirar isso um pouquinho, algo mais real, mais reativo, mais na direção do gol. Não significa que eu não queira a posse de bola, mas para mim, quanto mais rápido chegar ao gol adversário, melhor.

 

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Sobre o autor

Mauro Cezar Pereira nasceu em Niterói (RJ) e é jornalista desde 1983, com passagens por vários veículos, como as Rádios Tupi e Sistema Globo. Escreveu em diários como O Globo, O Dia, Jornal dos Sports, Jornal do Brasil e Valor Econômico; além de Placar e Forbes, entre outras revistas. Na internet, foi editor da TV Terra (portal Terra), Portal AJato e do site do programa Auto Esporte, da TV Globo. Trabalhou nas áreas de economia e automóveis, entre outras, mas foi ao segmento de esportes que dedicou a maior parte da carreira. Lecionou em faculdades de Jornalismo e Rádio e TV. Colunista de O Estado de S. Paulo e da Gazeta do Povo, desde 2004 é comentarista dos canais ESPN e da Rádio Bandeirantes de São Paulo.

Sobre o blog

Trazer comentários sobre futebol e informações, eventualmente em primeira mão, são os objetivos do blog. O jornalista pode "estar" comentarista, mas jamais deixará de ser repórter.