O que espera o Flamengo na Bolívia, além da altitude de Oruro?
por Joza Novalis*
O Flamengo pode ter dificuldades em Oruro. Não só pela altitude, mas por um embate de ideias. Enquanto Abel Braga deve colocar o time para se defender no confronto, o time boliviano vai jogar para tentar vencer na estreia pela Libertadores. Para uma equipe ser campeã na Bolívia, superando Strongest e Bolívar, precisa dispor de boa gestão. Isto ocorre com o Wilstermam, por exemplo, e tem acontecido com o San José, adversário dos rubro-negros nesta terça-feira de carnaval.
Por exemplo, o clube não gasta absolutamente nada com reforços, sempre busca gente em fim de contrato e, em geral, jogadores com certa idade. Consequentemente, a equipe é bem envelhecida, com uma média altíssima de idade. Mas são jogadores experientes, que sabem dosar ritmo, força, energia e convertê-los para o melhor da equipe. Algo ainda mais relevante jogando "nas alturas". Os números do título do torneio Clausura 2018 mostram 17 vitórias, 2 empates 7 derrotas.
Ou vence ou perde, raramente empata, pois a equipe se atira para o ataque. Sabia e sabe tirar proveito dos 3.735 metros acima do nível do mar. Mas a maioria de seus gols ocorre mesmo de dentro da área, em jogadas trabalhadas. Era assim com Eduardo Villegas e segue com o técnico atual, Nestor Clausen, campeão mundial como jogador pela Argentina em 1986. A cancha deve receber 35 mil pessoas, mas é um estádio olímpico, que mantém a torcida longe do gramado.
Villegas é um técnico de peso na Bolívia. Porém, após o título de 2018 ele assumiu a seleção do país. Clausen, que tem historia no Independiente, possui o mesmo estilo do anterior, o que deve pesar a favor do San José. Sua equipe deve forçar os acontecimentos em momentos-chave da partida, como nos minutos iniciais dos dois tempos assim como nos seus finais. Já a proposta de jogo tende a se adaptar à forma como joga os seus rivais.
Este é um diferencial em relação ao antecessor, ofensivo a todo o tempo e em quaisquer circunstâncias. Mesmo assim, o San Jose deve jogar com o compromisso de vencer o Flamengo, impondo o mando de campo, que na altitude costuma ter peso maior. Naquela típica conversa prévia à partida, Clausen alertará seus jogadores que o Flamengo é um gigante, mas que se eles conseguirem vencer a equipe brasileira serão mais gigantescos que os rubro-negros. O motivacional será utilizado.
Sua proposta é sempre a de não ter medo de enfrentar nenhum rival, independentemente de local e outras circunstâncias. Ou seja, Flamengo tem condições de vencer mesmo na altitude elevada e suas consequências quase que inevitáveis. Mas se o time carioca for a Oruro para se defender, estará fazendo justamente o que deseja o San Jose: ter campo para jogar. E é justamente aí que o Flamengo pode se complicar diante de um rival que em tese não é dos mais fortes.
Para o gol o San Jose contratou Carlos Lampe, que o Boca Juniors foi buscar no Huachipato em 2018, após a lesão de Andrada contra o Cruzeiro, mas ele sequer atuou pelo time argentino. No total, El Santo contratou 13 jogadores para a temporada 2019. Apenas quatro deles têm menos de 30 anos; boa parte dos demais, tem mais de 35, um deles, tem 40 anos. Todos chegam sem custos para a equipe boliviana. Conhecido no Brasil, Damián Escudero, que atuou pelo Vasco, em 2018, esteve perto do clube de Oruro, mas não acertou.
O próprio técnico Villegas, ainda no comando, o rejeitou. O argentino estipulara que seria contratado apenas para atuar pela Libertadores. O ex-técnico peitou os dirigentes e conseguiu vetar a contratação. O argumento era que se a equipe precisaria de jogadores em alto nível físico e com ritmo de jogo. Como um jogador poderia se dar ao luxo de não disputar nem os jogos do certame local, até para se preparar? Cheio de moral em toda a Bolívia o treinador convenceu o presidente Wilson Martínez a esquecer Escudero.
* é o maior conhecedor de futebol latino-americano na imprensa brasileira — Twitter: @jozanovalis
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